Algum tempo atrás eu escrevi um texto para o site sobre como os jogos da série Zelda portáteis criaram um estilo próprio de jogo e como esse estilo começou a se perder com o lançamento de Phantom Hourglass e Spirit Tracks. Não cheguei a publicar o texto, o que de certo foi bom porque algumas semanas depois a Nintendo anunciou a continuação de A Link to the Past, tornando meu artigo totalmente inútil. Isso porque eu terminava o texto em um tom pessimista, dizendo que não acreditava que a Nintendo voltaria atrás nesse caminho que resolveu tomar. Ruim para mim, que perdi um tempão escrevendo, mas bom para o universo Zelda e todos os seus fãs.
A razão do meu pessimismo na hora de escrever aquele texto foi porque demorou demais para a série entrar no clima de flashback pelo qual a Nintendo passou. Nesse contexto de reviver jogabilidades antigas foram lançados jogos como New Super Mario Bros. em 2006, Donkey Kong Country Returns em 2010, Kirby’s Return to Dream Land em 2011, mas nada de Zelda. Até mesmo Metroid com o The Other M teve um certo regresso às origens side-scrolling dos primeiros jogos.
Esse atraso não foi por falta do que resgatar. Assim como os Metroid Prime se tornaram algo muito diferente dos primeiros jogos, a série Zelda, a partir de Phantom Hourglass, começou a se modificar também. Tanto PH, quanto ST e SS viraram jogos bem mais lineares e mais dinâmicos. Enquanto o Templo da Água de Ocarina of Time é conhecido pela sua dificuldade, é quase impossível você não saber o que fazer em qualquer templo de PH; Link literalmente navega através de linhas nos mapas de ST; em SS nem mapa existe mais, cada região se conecta separadamente a Skyloft no maior estilo Super Mario 64 com os quadros e o castelo.
Certamente não são somente esses os elementos que diferenciam esses títulos dos mais antigos, mas eles ajudam a mostrar que as mudanças não foram pontuais na série, elas seguiram um caminho muito claro. A série foi de certo modo enxugada nesse processo, o que não era extremamente necessário para o gameplay em si foi menos trabalhado. Isso não é visto como ruim para muita gente. Lembro-me de uma conversa que tive com nosso querido Danilo “Ninja” Passos na qual eu tentava explicar porque eu achava ruim só ter uma cidade em SS, uma loja e um mapa fragmentado. Ele me perguntou então qual era a vantagem de existirem muitas lojas em OoT se elas dificilmente são usadas, ou a vantagem de ter que ficar cavalgando de um lado para o outro sendo que nada acontece nesse meio tempo.
Realmente não há vantagens pensando na eficiência do gameplay, no entanto esses elementos são importantes para a ambientação no jogo. Como o colunista Fabio conta no artigo A Fantasia de Zelda, a série é em sua origem uma história. O próprio nome dos jogos sugere que existe uma lenda e ela está relacionada com as tradições e crenças de todo um povo. A existência do herói não é o suficiente para que exista uma lenda, é preciso existir testemunhas dos grandes feitos do herói e ele precisa ser conhecido em diferentes regiões.
Talvez seja no The Wind Waker que essa ambientação é explorada em seu ápice. Embora o ritmo do jogo seja constantemente criticado, ele é o responsável pela grande imersão do jogador na história. Não há nenhuma grande vantagem em gastar bons minutos navegando de uma ilha para outra, mas é um elemento essencial para contar a história do Herói dos Ventos e mostrar como sua jornada para salvar sua irmã é custosa. Todas as ilhas, desde as mais importantes até as mais ínfimas mostram que não é a história de apenas um herói e sim de toda uma região e as pessoas que vivem nela, até porque não há herói sem o seu povo.
Em contraponto, durante SS, Link pratica a jornada mais solitária desde o The Legend of Zelda para NES. Cada região é como uma dungeon gigante onde há inimigos, puzzles e obstáculos por toda parte e os NPCs estão simplesmente por lá porque sim. Link é praticamente a única testemunha de sua aventura, já que Fi adormece no final e a Zelda estava em uma jornada própria durante boa parte do jogo.
Por isso, em sua essência, Zelda precisa ser um jogo de detalhes “desnecessários” e com muita exploração. Vemos nas mudanças que o TWWHD teve que há uma forte pressão para que a série seja mais dinâmica e sucinta, mas talvez não seja esse o modo certo de contar uma história. A série não precisa entrar nessa planificação cultural em que o importante é apertar os botões o mais rápido possível no maior estilo beat ‘em up (ou tetris).
Os recentes anúncios sobre a série, no entanto, têm afastado um pouco essas preocupações da minha cabeça. Voltar ao A Link to the Past, ao mapa quadriculado dos portáteis pode significar um resgate dos pontos mais importantes para a série que acabaram se perdendo no caminho. Aonuma já disse que quer fazer os jogos menos lineares daqui para frente. Pode até ser que tudo mude novamente e esse texto se torne inútil de novo, mas é muito bom terminá-lo otimista em relação ao futuro da série Zelda dessa vez. O tempo dirá.