Skip to main content

Zelda - Série Animada“EXCUUUUUUUUUSE-ME, PRINCESS!”

Nem todo mundo conhece o já tão difamado bordão acima, isso porque ainda não são muitos os que sabem que a série ganhou um desenho animado no finalzinho dos anos 80.

E não é de se estranhar, já que não foi capaz de reproduzir muito bem a sempre fundamental essência dos jogos. Até hoje, é comum entre as grandes franquias divulgar um determinado produto cultural através de outras mídias, como literatura ou cinema, para alavancar ainda mais o seu sucesso, e devo dizer que, para a época, o desenho contava com uma animação razoável, e, com algumas ressalvas, mantinha-se fiel aos dois primeiros jogos em que foi baseado. Num período em que jogos, desenhos e afins não tinham um público tão exigente e seletivo quanto a enredos cheios de reviravoltas mirabolantes, a formulinha básica “Ganon arma um plano para obter a Triforce da Sabedoria e é impedido pelos protagonistas”, utilizada em 90% dos episódios escritos por Bob Forward (que já havia participado de séries animadas como She-Ra, BraveStarr, e, posteriormente X-Men Evolution, O Incrível Hulk e Quarteto Fantástico) conseguia entreter a audiência por cerca de quinze minutos de cada capítulo sem maiores problemas. Então, por que a série animada de Zelda não foi para a frente e acabou sendo cancelada com apenas treze episódios produzidos?

Tela de abertura do desenho

Tela de abertura do desenho

Como disse, a série, sem nada que possa ser classificado como extraordinário, cumpriu seu papel de divulgar os jogos. Fazendo um esforço para tentar imaginar como as coisas seriam se eu assistisse a um ou dois episódios sem conhecimento da existência dos videogames, creio que teria um mínimo de interesse em poder jogar algo que a retratasse. Mas também disse que havia exceções e incoerências por trás dessa lealdade e autopropaganda dos jogos, e basta uma delas para fazer qualquer um criar repúdio pelo pobre desenho em menos de dois minutos do primeiro episódio: Link.

O garoto de roupa verde, e que na ocasião ainda não era louro, é dono de uma personalidade infantil como nunca foi vista nos jogos, sendo presunçoso, exibido, e até um pouco sarcástico. Mas antes de entrarmos em pânico, é preciso relevar um detalhe importante: dessa vez, tratava-se de uma animação, isto é, as personagens seguem o roteiro por conta própria, e não por decisão do expectador, portanto, é natural que Link não poderia ser o mesmo protagonista silencioso cujas decisões cabiam a nós. Sem falar que o herói, geralmente, costuma ser “arrastado” para sua grande missão predestinada sem qualquer preparo especial. Não são poucas as vezes que nos pegamos pensando na insegurança que deve pairar pela cabeça do garoto no início de suas aventuras, por mais corajoso que sempre seja. Sua contraparte no desenho, por outro lado, adora se aventurar pelas terras de Hyrule enfrentando monstros, e facilmente se entedia com seu novo “emprego” de guardião da Triforce da Sabedoria, sendo forçado a viver entre as paredes do castelo real. E talvez tenha sido essa a maneira que os produtores escolheram para dar a esse outro Link seu próprio carisma, tornando-o um rapaz hiperativo que adora arranjar encrenca com os vilões.

Falando em vilões, Ganon também não escapou de adaptações, embora de maneira bem menos radical que seu arqui-inimigo. Além de estar com sua aparência de porco humanoide, o vilão é desprovido de qualquer força física e, mesmo mantendo seu ar de feiticeiro maligno, tem várias passagens cômicas( sendo que em quase todas os verdadeiros créditos pertencem a Len Carlson, seu brilhante dublador), em especial quando deixa seu covil no submundo e invade a superfície de Hyrule, onde suas habilidades são limitadas. Dono da Triforce do Poder, e com a Triforce da Coragem inexistente, almeja se apoderar da Triforce da Sabedoria para governar Hyrule. No entanto, ele e seu exército de Moblins, Stalfos, Octoroks e outros inimigos recorrentes da série acabam sempre derrotados e enviados de volta ao Evil Jar (uma espécie de receptáculo onde Ganon e seus subordinados permanecem temporariamente confinados ao fracassarem) pela Crissword, que mais se assemelha a uma adaga longa do que a uma espada propriamente. A arma de Link corresponde à Sword Beam usada pelo herói nos jogos originais, capaz de disparar raios de energia nos inimigos, mas, curiosamente, é ineficaz contra seres humanos, como em certa ocasião em que o protagonista tenta atingir uma forasteira de uma terra distante, acreditando que esta estava sob o comando de Ganon, e o ataque não surtiu efeito algum.

Completando o trio de personagens principais, temos Zelda. Devo dizer, ela é o maior aspecto positivo desse desenho, a ponto de ser minha segunda princesa de Hyrule preferida em toda a série, empatada com Tetra e atrás apenas da Zelda de Skyward Sword. Mesmo exclamando periodicamente um aflito “Link, ajude-me!”, ela conseguiu fugir do estereótipo de donzela inocente de uma forma muito feliz, mesclando na dose certa a inexperiência e fragilidade de garota que nunca costumou ir além das muralhas do castelo, com uma personalidade forte, decidida e independente. Zelda, que até então não era diferente de uma irmã da Peach, de repente, passou a ser confundida com uma irmã da Samus, e não foram poucas as ocasiões em que coube à princesa salvar a pele do herói. A maneira irônica e desdenhosa com que trata Link a torna responsável pelos melhores diálogos, com destaque para as incessantes tentativas dele em lhe roubar um beijo. Depois de um tempo, isso torna-se cansativo, mas, graças à zombaria da heroína, de vez em quando renderá boas risadas.

cartoon - Princesa Zelda Cartoon

Diferente da maioria dos jogos, aqui ela sabe se virar muito bem

Há também outros personagens que aparecem com menos frequência, como o benevolente e carismático rei de Hyrule chamado Harkinian, o mesmo nome do monarca nos quadrinhos The Legend of Zelda e nos jogos paralelos lançados para o console Philips CD-i. Já Spryte, que trabalha no castelo como ajudante, é uma versão menos comportada e igualmente tagarela da fada Navi. A fadinha companheira de Link no desenho não se preocupa em disfarçar a queda que tem pelo jovem e é a principal razão de seus fracassos ao tentar beijar Zelda.

Outro detalhe importante é que, não muito diferente do que era visto no desenho Super Mario Bros., exibido na TV por volta da mesma época, é interessante observar como algumas características próprias dos jogos foram mantidas de maneira genuína, sem qualquer tipo de adaptação a favor do realismo. Assim, inimigos derrotados deixam itens como recompensas, e até o inventário infinito de Link, um dos mais intrigantes e divertidos dilemas da série, está presente. Os acessórios encolhem ao serem guardados nos bolsos dos protagonistas, para ressurgirem em tamanho normal por mágica quando necessários. Uma interpretação conveniente, e não necessariamente um ponto negativo.

Desse modo, podemos chegar à conclusão de que o desenho não é tão ruim, e não somente pelo ponto de vista daqueles que o achavam o máximo há mais de vinte anos. É bem verdade que a nostalgia pode ser inimiga mortal da imparcialidade, mas ainda que tentemos assistir a esse desenho pela primeira vez, é possível, sim, fazer isso sem arrependimentos depois, mesmo porque a série animada, da mesma forma que os mangás e quadrinhos, não é parte canônica da franquia… então, por que levá-la tão a sério? Com uma visão descompromissada, e um pouquinho de boa vontade, você pode até sentir a falta de um décimo quarto episódio.

Deixar uma resposta